Wener Heisenberg foi um dos primeiros na abertura do caminho para o estranho mundo do quantum. Será estranho uma palavra adequada para descrever o quantum? Considere dois dos principais problemas conceituais da física quântica: (1) o efeito de não-localidade, que significa que diferentes partes do sistema quântico parecem se influenciar umas às outras mesmo quando separadas por uma grande distância e ainda que não haja conexão evidente entre elas; (2) e o chamado problema da medição, que surge da idéia que os sistemas quânticos têm de possuir propriedades mensuráveis ainda que pareça não haver nada fora da física quântica capaz de fazer essas medições. A física quântica põe em questão as noções convencionais sobre o mundo físico e suas implicações são profundas.
UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE HEISENBERG
Heisenberg nasceu dia 5 de Dezembro de 1901 em Würzburg, Alemanha, filho casula de August e Anna Heisenberg. Seu pai era professor especializado em história bizantina e o menino Wener foi criado na atmosfera de uma refinada comunidade acadêmica de classe média alta. Heisenberg freqüentou a escola primária primeiro em Würzburg e mais tarde em Munique, quando a família se mudou para lá. Ainda no primário, começou a ter aulas de piano e aos 13 anos já tocava composições dos grandes mestres. Foi a vida toda um excelente pianista.
Em 1911, Heisenberg ingressou no Maximilians-Gymnasium, cujo diretor era seu avô materno. Ali, seus extraordinários talentos no campo da matemática foram reconhecidos pela primeira vez. À época dos exames finais, ele havia aprendido cálculo sozinho, trabalhando nas propriedades das funções elípticas, e, aos 18 anos, havia tentado publicar um artigo sobre a teoria dos números.
Mas a vida de Heisenberg não era toda acadêmica. A época que se seguiu à primeira guerra mundial foi um período de sublevação na Alemanha e as ruas de Munique eram um palco de muita agitação política. A derrota da Alemanha na guerra e a abdicação do Kaiser provocaram inquietação em todo o país. Na Bavária, uma república socialista se implantou em 1918, seguida em 1919 por uma república de orientação bolchevique que foi derrubada por tropas de Berlim. O jovem Heisenberg, que apoiava o movimento nacionalista representado pelo exército, participou de várias lutas de rua contra grupos comunistas.
Muitos rapazes alemães pertenciam a organizações de jovens como os Desbravadores Alemães, que fora fundada para inspirar o nacionalismo e a prontidão para a guerra, ou a Liga Bávara Jovem, patrocinada pelo Estado, contra a qual alguns dos adolescentes do Maximilians-Gymnasium se rebelaram, criando uma nova organização. Na busca de um líder, encontraram Wener Heisenberg, então com 17 anos. Ele era ideal para o papel: um aluno mais velho, desiludido com a ordem estabelecida, querido na escola e dotado de autoconfiança intelectual e de boa aparência. O Gruppe Heisenberg, como a nova organização ficou conhecida, desvinculou-se da Liga Bávara Jovem, embora tenha continuado a pertencer aos Desbravadores, e durante algum tempo se reuniu na casa de Heisenberg. Ele, no entanto, estava mais voltado para atividades atléticas que para questões políticas. Seus principais interesses eram escalar montanha, esquiar e acampar. Durante suas excursões à região das montanhas, Heisenberg e seus seguidores engajavam-se frequentemente em debates filosóficos ou jogavam xadrez. Heisenberg era um exímio jogador de xadrez. Foi famoso por isso desde muito menino e era conhecido por realizar partidas de xadrez durante aulas da escola, debaixo da carteira. Muitas vezes jogava sem sua rainha para dar ao adversário uma chance de ganhar. Diz-se que ele e o irmão mais velho, Kurt, de vez em quando chegavam a jogar xadrez mentalmente enquanto caminhavam.
Longe de abraçar a política extremista incentivada pelo movimento juvenil, Heisenberg tornou-se cada vez mais apolítico e academicamente elitista. Acreditava que ciência e política não se devem misturar, e a ciência estava se tornando sua obsessão.
Heisenberg entrou na universidade de Munique em 1920. Pretendia estudar matemática pura, mas, por alguma razão o eminente professor de matemática Ferdinand Von Lindemann recusou-se a admiti-lo em seu seminário para estudantes avançados. Segundo o relato que o próprio Heisenberg fez se sua entrevista com Von Lindemann, o professor tinha em seu colo um cachorro que latiu o tempo todo e mal ouviu uma palavra do candidato. O pai de Heisenberg conseguiu então para ele uma entrevista com, o professor de física, Arnold Sommerfeld, que não só aceitou o jovem estudante como se tornou seu mentor e guia nos mistérios da física teórica. Foi uma sequencia fortuita de acontecimentos: o instituto de Sommerfeld era então o único na Alemanha a enfatizar a teoria quântica da física atômica.
Além da física, Heisenberg estudou os clássicos, em particular as obras científicas dos filósofos da Grécia antiga, de Platão e Aristóteles a Demócrito e Tales. Seu interesse pela relação entre filosofia e ciência perdurou por toda a vida. Durante seus anos de graduação com Sommerfeld, ele travou conhecimento com um notável colega estudante de física, chamado Wolfgang Pauli, que se tornou seu melhor amigo, por vezes colaborador, e frequentemente seu crítico mais severo.
UM RÁPIDO PARENTESE.
Em 1925, acometido de febre do feno, Heisenberg tirou uma licença de duas semanas e viajou para a ilha de Helgoland, ao largo da costa da Alemanha. Ali, lembrou mais tarde, a natação no mar frio e longas caminhadas na praia limparam-lhe a mente para um ataque revigorado à matemática do átomo. Apenas alguns dias depois de iniciado o passeio, fez uma importante descoberta. Com uma estranha matemática que inventou para esse fim, Heisenberg começou a perceber um meio para construir uma estrutura em que os números multiplicados numa direção forneciam com freqüências produtos diferentes dos obtidos multiplicando-se os mesmo números na direção oposta. Heisenberg voltou para a Universidade de Göttingen, onde estudava sob a orientação do Matemático Max Born, eufórico com as suas descobertas nascentes e ansioso para falar sobre elas com Max Born. Este identificou a estranha matemática de Heisenberg como álgebra matricial, um sistema que havia sido inventado na década de 1850, mas não fora ensinado a Heisenberg.
Uma matriz é uma tabela bidimensional de números. Na álgebra matricial, foram concebidas normais pelas quais duas matrizes podem ser multiplicadas uma pela outra para dar outra matriz e, ao fazê-lo, as matrizes obedecem as leis de multiplicação não-convencionais. Na álgebra matricial, o produto de B e A não é igual ao produto de A e B, quando na multiplicação comum de números, o produto de, por exemplo, 5 e 4 é o mesmo que o produto de 4 e 5 – ambos são iguais a 20. Na concepção de Heisenberg, cada átomo seria representado por uma matriz e o movimento dos eletros no interior do átomo poderia ser representado por outra matriz. Em três meses de trabalho intenso, Born, Heisenberg e Pascual Jordan usaram a idéia de Heisenberg para arquitetar uma estrutura matemática coerente que parecesse abarcar todos os múltiplos aspectos da física atômica. A prestidigitação matemática de Born/Heisenberg/Jordan permitiu a previsão extremamente precisa de resultados experimentais relativos à radiação atômica.
O PRINCÍPIO DA INCERTEZA.
Na primavera de 1927, Wener Heisenberg, então com apenas 26 anos, propôs a Zeitschrift für Physik um curto artigo intitulado “Sobre o conteúdo perceptivo da cinemática e da mecânica quântica teórica”. Esse texto de 27 páginas, enviado da Dinamarca para a revista, continha a formulação do famoso “princípio da incerteza” na mecânica quântica (também conhecido como “princípio da indeterminação”) e assegurou a Heisenberg um lugar na história da ciência. Isso porque o princípio da incerteza tem amplas implicações não só para a física subatômica como para todo o conhecimento humano.
A compreensão que está no cerne do princípio da incerteza surgiu das tentativas teóricas para determinar a órbita exata dos elétrons em circulação num átomo. Para detectar a posição de um elétron num átomo, é necessário iluminá-lo de alguma maneira; isto é, um feixe de alguma radiação eletromagnética de cumprimento de onda curto deve ser concentrado no elétron. Essa radiação iluminante, contudo, comporta-se como um grupo de partículas, e estas – ou até só uma delas – ao colidir com o elétron, alteram-lhe a posição. Mais ou menos como uma bola de bilhar que atinge e move uma outra. Portanto, o próprio ato de iluminar o elétron para observá-lo e medir sua posição altera-lhe o movimento e, consequentemente, deixa de ser possível medir sua posição com certeza.
Pode-se fazer uma analogia simples, que ajuda a explicar o princípio, com uma sala de aula cheia de estudantes. O diretor da escola não tem como descobrir sobre observação direta como os alunos se comportam normalmente porque o mero fato da sua entrada na sala de aula os faz se comportarem de uma maneira atípica. Para dar um outro exemplo, quando se tenta medir a temperatura da água quente de uma chaleira sobre o fogão, a própria inserção de um termômetro na água muda a sua temperatura – não muito, é claro, mas o suficiente para torna a sua exatidão impossível. O mesmo se aplica a todas as quantidades físicas. O ato da observação pode ser compreendido mais facilmente no nível microscópico, porque não é difícil imaginar o quanto partículas extremamente pequenas, como os elétrons, podem ser afetadas por algo tão débil como um feixe de luz. É da máxima importância, porém, entender que Heisenberg e seus colegas revelaram que a incerteza não está confinada ao microcosmo. Heisenberg mostrou que, na verdade, a incerteza impregna toda a natureza; não é mero efeito colateral anômalo do trabalho com variáveis experimentais diminutas. A incerteza está sempre presente, inescapável. A matemática desenvolvida por Heisenberg mostra que o produto – isto é, o efeito final – das incertezas de, por exemplo, posição e velocidade, ou posição e momento, ou tempo e freqüência, muitas vezes está longe de ser insignificante e sempre é maior que uma quantidade física muito pequena.
A posição e o momento de uma partícula elementar não podem ser ambos conhecidos simultaneamente. A razão disso é que se fosse possível manter um elétron imóvel tempo suficiente para que sua posição fosse determinada, já não seria possível determinar seu momento. Uma idéia especial é que o produto das incertezas (ou dispersão de valores possíveis) é sempre pelo menos igual a um certo número mínimo. O pesquisador frustrado a procura de certeza é sempre obrigado a transigir. O conhecimento ganho no tocante ao tempo, por exemplo, é pago em incerteza no tocante à freqüência, e vice-versa.
Que diferença faz essa inexatidão para nós que vivemos no mundo mais amplo, o macrocosmo? A resposta é que, embora todas essas medidas envolvam algum grau de incerteza, na escala macroscópica ele não é significativo. Podemos continuar voando de Belém a São Paulo com a certeza de alcançar nosso destino final. Não atingiremos exatamente o alvo, mas estaremos suficientemente próximos. Podemos até lançar satélites nas profundezas do espaço com a certeza de que, ainda que nossos gatos sejam um pouquinho inexatos, o erro será tão pequeno que nenhum instrumento de medida poderá detectá-lo.
Ainda assim, pode ser filosoficamente perturbador compreender que há uma inexatidão inerente em tudo o que fazemos, em cada medição que fazemos. Alguns matemáticos, por exemplo, gostariam de acreditar que quando fazem todos os seus cálculos de maneira mais acurada possível, o resultado é inteiramente previsível. Mas não é o que acontece, segundo o princípio de Heisenberg. A própria tentativa de conhecer com precisão qualquer fato físico é fundamentalmente invasiva. Devemos por isso desistir da investigação científica? Obviamente não. A pesquisa cientifica prossegue, mas temos nova compreensão da suas limitações.
Com o tempo, as plenas implicações do princípio da incerteza de Heisenberg começaram a emergir. Primeiro os físicos quânticos aceitaram as idéias de Heisenberg, depois outros cientistas, e finalmente uns poucos do público esclarecido em geral. Com essa aceitação veio a compreensão perturbadora de que a incerteza não está confinada no laboratório.
Logo se descobriu analogias com a mecânica quântica em muitos outros campos, e começou-se a fazer perguntas inquietantes sobre o próprio conhecimento. Haveria alguma área da investigação humana em que o conhecimento poderia ser pensado certo e correto? Mesmo no campo da matemática, por muito tempo considerado a cidadela da certeza, surgiram duvidas. O matemático austríaco Kurt Gödel mostrou no inicio da década de 1930 que no interior de qualquer sistema lógico, por mais rigidamente estruturado que seja, sempre há questões que não são possível resolver com certeza, sempre se pode descobrir contradições e imprecisões que nele se esgueiraram.
Outra implicação importante e digna de comentário da incerteza é seu efeito na casualidade – a relação entre causa e efeito. Uma causa produz um efeito. Na física clássica, se compreendermos plenamente a natureza de uma causa particular, podemos prever o efeito. Causa e efeito e previsibilidade, pedras angulares da física clássica, agora estavam em questão. Se é possível medir com precisão, ao mesmo tempo, a posição e a velocidade de um elétron (ou de qualquer outra partícula), então é também impossível prever exatamente onde esse elétron estará em qualquer instante dado posterior.. Um experimentador poderia enviar dois elétrons na mesma direção, e eles não iriam terminar necessariamente no mesmo lugar. Na linguagem da física, a mesma causa poderia produzir diferentes efeitos.
A influência de Heisenberg foi tão difusa que pode ser detectada até no mundo da ficção. Num artigo publicado no New York Times Book Review, um crítico disse a propósito de uma romancista: “Ela conhece o bastante sobre Heisenberg para compreender que o ato de observar altera o objeto que está sendo observado; ou, em termos literários, que o ato de contar a história altera a história que está sendo contada.”
Uma breve discussão dos problemas mais famosos dos problemas, o aparente paradoxo EPR e o do gato vivo/morto de Schröndiger, vai ajudar nosso entendimento da realidade quântica.
PARADOXO EPR.
Apesar da aceitação geral da teoria quântica, diversos aspectos da mecânica quântica tal como por Bohr e Heisenberg, deixavam muitos físicos incomodados, e nenhum mais que Albert Einstein. Uma discordância especial de Einstein incidia sobre uma das mais estranhas asserções da teoria quântica: a de que o caminho que uma partícula seguirá ao se mover de um ponto para outro – de A para B – não possa ser conhecido. O caminho não pode ser determinado com precisão. E não apenas isto, mas todos os caminhos são possíveis, e a cada um deles está associada uma probabilidade. O máximo que podemos fazer, segundo a teoria, é calcular essas probabilidades e com base nisso prever a rota. Einstein, ao contrário, afirmava que se um elétron parte do ponto A e o vemos chegar ao ponto B, o bom senso manda admitir que ele tomou um caminho especifico de A para B.
Além disso, Einstein não aceitava as afirmações da teoria quântica no tocante ao problema da medição. Para mostrar o que em seu ver eram as incoerências da mecânica quântica, trabalhou com seus dois jovens assistentes em Princeton, Boris Podolsky e Natham Rosen, e propôs um experimento mental hoje conhecido como o experimento EPR, das iniciais dos sobrenomes de seus inventores. Antes de passar à explicação desse experimento hipotético, porém, consideremos dois exemplos precursores propostos pelo físico irlandês John Bell.
O Dr. Bell introduziu um de seus exemplos num ensaio intitulado “As meias de Bertlmann e a natureza da realidade” incluído em seu livro Speakable and Unspeakable in Quantum Mechanics. Bell fala de um certo Dr. Bertlmann, que gostava de usar pares de meias de cores diferentes, ou melhor, pares de meias de cores desencontradas. De que cores seriam as meias que o Dr. Bertlmann usaria num determinado dia era coisa imprevisível. No entanto, quando alguém o via andando a passos largos pela rua e notava que sua meia esquerda era cor-de-rosa, sabia no ato que a outra não era cor-de-rosa. A observação do primeiro pé e o conhecimento do hábito invariável de Bertlmann forneciam informação imediata sobre o segundo pé. Isto parece bastante simples.
O segundo exemplo de Bell era igualmente simples. Suponha que uma moeda foi fatiada ao meio, de tal modo que cara e coroa ficaram completamente separadas. Sem que ninguém olhe para eles, os dois pedaços são enviados para diferentes partes do mundo no bolso de suas diferentes pessoas. A primeira pessoa que olhar a moeda que leva no bolso vai encontrar ou uma cara ou uma coroa e vai saber de imediato o que a outra pessoa vai encontrar quando olhar a sua. Einstein, Podolsky e Rosen usaram a mesma lógica em seu ataque aos preceitos fundamentais da mecânica quântica. A idéia básica subjacente a seu experimento hipotético foi usar informação experimental de uma partícula para deduzir as propriedades, como a posição e o momento, de uma segunda partícula. Einstein, Podolsky e Rosen imaginaram duas partículas que interagem uma com a outra e depois se afastam velozmente, não interagindo com mais coisa alguma até que o experimento investigue uma delas. Cada partícula tem seu próprio momento e cada uma está localizada em alguma posição o espaço. Segundo as regras estabelecidas pelo trio EPR, o experimentador hipotético tem condições de medir precisamente momento total (isto é, os momentos somados) das duas partículas, bem como as distâncias entre elas quando estão muito próximas.. Quando, num instante posterior, o experimentador medir o momento de uma das partículas, ele deverá saber, automaticamente, qual é o momento da outra porque o total não foi alterado. O experimentador poderia igualmente medir a posição precisa da primeira partícula e, da mesma maneira, deduzir a posição da segunda partícula. Por outro lado, o princípio da incerteza afirma que a medição do momento da partícula A impede o conhecimento preciso da sua posição. O que incomodava Einstein e seus colegas era a ideia, inerente a interpretação Bohr/Heisenberg da física quântica, de que o estado da partícula B dependia de qual das duas medições o experimentador escolheu fazer na partícula A. Como pode a partícula B “saber” se deve ter um momento precisamente definido ou uma posição precisamente definida? Parecia aos autores do artigo EPR que, no mundo quântico, medições feitas numa partícula em um ponto do espaço afetam de algum modo a parceria dessa partícula em algum ponto distante do espaço.
A aceitação da interpretação do princípio, ressalta o artigo EPR, faz com que a realidade da posição e do momento no segundo sistema dependa do processo efetuado no primeiro sistema, o qual na perturbou o segundo sistema em absoluto. A equipe EPR concluiu que “não se poderia esperar que nenhuma definição sensata da realidade admitisse isso”. O artigo EPR sustentava que a interpretação do princípio era falha.
Essencialmente, a divergência entre a equipe EPR e a equipe Bohr/Heisenberg diz respeito ao que constitui uma definição “sensata” da realidade. Segundo a interpretação de realidade de Heisenberg, a posição e o momento da segunda partícula não tem nenhum significado objetivo até serem medidos, seja o que for que se tenha feito com a primeira partícula. Cabe lembrar que, segundo regras estritas de mecânica quântica, não há nenhuma realidade claramente definida até que ela tenha sido observada.
No devido tempo, Bohr e companhia assinalaram uma discrepância lógica no artigo EPR: mesmo que aparelho de medida fizesse exatamente o que seus três inventores disseram que faria – primeiro medir a posição exata de uma partícula distante e depois, após alguma modificação, medir o momento exato dessa partícula distante -, a necessidade de duas medições isoladas e distintas continuaria sendo uma verdade. Numa medição única nunca se poderia medir tanto a posição quanto o momento com precisão. Portanto, os preceitos centrais da mecânica quântica permaneciam inviolados. Nem assim, porém, Einstein se deixou convencer.
Essas controvérsias foram apresentadas aqui, é claro, numa linguagem muito simplificada. Na realidade elas se deram na linguagem mais poderosa da matemática avançada. Uma contribuição importante sob esse aspecto foi dada em 1964, por John Bell (os das meias de Bertlmann e das moedas partidas). Num artigo intitulado “Sobre o paradoxo EPR”, Bell explicou o experimento em termos matemáticos. Em seguida se descobriu que, usando o na época chamado teorema de Bell, podia-se realmente efetuar o experimento EPR, o que desde então os físicos fizeram muitas vezes. Em todos os caos testados, provou-se que Einstein, Podolsky e Rosen estavam errados.
Bem antes que esses resultados experimentais esmagadoramente positivos confirmassem a teoria, a física quântica vinha obtendo crescente sucesso na prática. Na década de 1930, Linus Pauling e outros explicaram a ligação química usando a mecânica quântica. Também nessa época, Heisenberg, Enrico Fermi e outros demonstraram experimentalmente que a teoria era válida no nível subatômico. Como o expressou P.A.M Dirac, a mecânica quântica explicou “a maior parte da física e a totalidade da química”.
O GATO DE SCHRÖDINGER.
Com a aceitação geral da física quântica, porém, surgiu uma nova e importante questão: onde termina o mundo quântico e começa o mundo clássico? A experiência humana diária tem lugar no macrocosmo, e nenhum dos efeitos bizarros descritos pela “estranha” teoria quântica é de fato experimentado. Que tamanho um objeto deve possuir para que a teoria quântica pareça já não mais se aplicar? Em 1935, Erwin Schrödinger propôs um experimento mental que se tornaria famoso e que mostra que a teoria quântica talvez não se aplique fora do microcosmo.
Todos que tenham lido um dos muitos livros de divulgação científica sobre mecânica quântica já terão certamente encontrado o pobre, maltratado, felino de Schrödinger. Ainda assim, esse pobre bichano gerou tanta especulação e controvérsia que as paradoxais implicações de seu destino merecem um breve exame.
Schrödinger propõe que se feche um gato hermeticamente numa caixa de aço, junto com uma fonte radioativa fraca e um detector de partículas radioativas. A caixa deve conter ainda um frasquinho de gás venenoso e um martelo suspenso sobre um mecanismo disparador. Se o martelo for solto quebrará o frasco, liberando o gás. O detector que está na caixa é ligado uma única vez e apenas durante um minuto. O material radioativo, por sua vez, tem 50% de chance de emitir uma partícula radioativa durante esse minuto, portanto 50% de chance de não o fazer. Se uma partícula for detectada, o esquema letal será desencadeado, o gás será liberado e o gato, morto. É importante observar que ninguém pode ver o interior da caixa.
Segundo a interpretação estrita da física quântica, passado um minuto e antes da caixa ser aberta, não podemos falar do gato como ou vivo ou morto, pois não podemos observar se ele está vivo ou morto. Para os que acreditam que a física quântica se aplica também no macrocosmo, o gato está num estado indeterminado, uma espécie de vida suspensa, nem vivo nem morto. Só depois que a caixa for aberta pode se conferir a condição de vivente.
Talvez a intenção de Schrödinger nesse experimento hipotético foi mostrar as limitações da interpretação da mecânica quântica – que a teoria quântica simplesmente não pode ser aplicada a toda realidade. No entanto, ela foi muitas vezes interpretada de outra maneira. Para muitos observadores, é óbvio que o gato não pode está vivo e morto ao mesmo tempo. Para os que aderem a interpretação estrita da mecânica quântica, porém, o gato vivo/morto não difere do elétron, que pode ser uma onda e uma partícula ao mesmo tempo.
O gato de Schrödinger vem à baila com tanta freqüência nos livros de popularização da ciência que leva alguns físicos ao desespero. “Quando ouço falar do gato de Schrödinger”, Stephen Hawking declarou certa vez, “eu saco o revolver.”A coexistência do gato vivo/morto. |
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