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sábado, 6 de novembro de 2010

De um Diário Íntimo do Fim do Século Trinta.


 Tenho 9 anos. Meu nome é Gavrilo. Meu professor só hoje me permitiu uma ida ao jardim  botânico, por causa da minha redação sobre a formula de Einstein. Elogiou em aula o meu trabalho porque, disse ele, em vez de dar-lhe um interpretação, como fazem todas as crianças, eu me limitei a dizer que aquela simples fórmula era uma coisa tão absurda e maravilhosa e inacreditável como as lendas pré-históricas, por exemplo a lâmpada de Aladino" ou " A vida de Napoleão e seu cavalo branco". Por isso começo hoje o meu diário, que eu devia ter começado aos meus 7 anos. Mas nessa idade a gente só escreve coisas assim: "A Adalgisa caminha como um saca-rolha" ou pusemos na inspetora geral de ensino o apelido de Dona programática". Pois lá me fui com outros meninos e meninas que também tinham merecido a menção pública, ao jardim botânico, que me pareceu pequeno porque constava apenas de uma cúpula de vidro. Havia uma fila enorme de turistas e visitantes domingueiros. Lá dentro não era apenas ar condicionado, era um vento leve, uma "brisa", explicou-os o professor. Uma brisa que agitava os cabelos da gente e as folhas da árvore. Sim, porque lá dentro só havia uma árvore, a única árvore do mundo e que se chamava simplesmente "a árvore", pois não havia razão para diferençar de outras. Suas folhas agitavam-se e tinham um cheiro verde. Não sei se me explico bem. Não importa: este diário é secreto e será queimado publicamente com outros, de autoria dos meninos da minha idade, quando atingirmos os 13 anos. Dona programática nos explicou a necessidade desses diários porque, "para higiene da alma e preservação do indivíduo, todos têm direitos a uma vida secreta, ao contrário do que acontecia nos tempos da Inquisição, da censura, dos sucessores do Dr. Sigmund Freud e dos entrevistadores jornalísticos".
  Isto diz Dona programática. Mas o nosso professor de Redação, que não é tão cheio de coisas, diz que esses nossos diários secretos servem para a gente dizer besteiras só por escrito em vez de as dizer em voz alta.
  Na próxima vez tratarei de fazer uma boa redação sobre a Árvore para ver se ganho o prêmio de uma visita ao Zôo - onde está o cavalo. Andei indagando dos grandes sobre este nosso cavalo e me disseram que não, que ele não era branco, uma pena...